Na semana passada, Campinas (SP) foi palco de um significativo avanço no debate sobre a regulamentação da cannabis medicinal no Brasil. A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) sediou um seminário internacional que reuniu especialistas, acadêmicos, representantes do governo e associações de pacientes, todos com o objetivo de discutir e propor diretrizes para a regulamentação da produção, distribuição e uso terapêutico da cannabis no país.
Um Marco na Discussão Acadêmica e Política
O evento, apoiado pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos (Senad), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), foi organizado pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (Proec) da Unicamp. Este seminário se alinha às atividades do Grupo de Trabalho (GT) de Regulamentação da Cannabis do Conselho Nacional de Política sobre Drogas (Conad), cujo objetivo é embasar o debate acadêmico e influenciar as políticas públicas sobre o tema.
Participação Internacional e Nacional
O seminário contou com a presença de palestrantes internacionais que trouxeram valiosas contribuições, compartilhando detalhes das regulamentações existentes em seus países, como Alemanha, Nova Zelândia e Estados Unidos. As comparações entre diferentes cenários e processos de regulamentação, bem como as evidências científicas dos usos terapêuticos da cannabis, foram cruciais para o enriquecimento do debate.
Pesquisadores brasileiros também tiveram um papel fundamental, apresentando atualizações sobre estudos locais e evidências científicas relevantes. Além disso, representantes de diversos órgãos do Governo Federal abordaram os aspectos legais e políticos da regulamentação, fornecendo uma visão abrangente e multidisciplinar sobre o tema.
A Importância da Regulamentação Apropriada
Mauricio Fiore, diretor de Pesquisa, Avaliação e Gestão de Informações (Dpagi) da Senad, destacou a urgência de uma regulamentação mais adequada para a cannabis medicinal no Brasil. Segundo Fiore, estima-se que cerca de 400 mil pessoas no país utilizem cannabis para fins terapêuticos, enfrentando desafios como a necessidade de recorrer à Justiça ou a normas de importação da Anvisa, o que gera altos custos.
“A importância do Conad se debruçar sobre o tema, com base em uma ampla articulação política e em evidências científicas, é crucial para qualificar a discussão e propor soluções viáveis e acessíveis para a população,” explicou Fiore.
Contribuições para o Relatório Final do GT de Cannabis
O seminário também teve como objetivo fornecer subsídios ao GT de Cannabis do Conad, que está em processo de finalização de um relatório a ser apresentado ao plenário. Este relatório será fundamental para a formulação de políticas públicas que atendam às necessidades dos pacientes e alinhem o Brasil com práticas internacionais bem-sucedidas.
Andrea Gallassi, professora da Universidade de Brasília (UnB) e coordenadora do GT, enfatizou a importância de apresentar as melhores evidências sobre o uso de cannabis para diversas condições de saúde. O GT tem realizado consultas dirigidas para ouvir diversos setores interessados, garantindo que todas as vozes sejam consideradas no processo de regulamentação.
O Cenário Internacional como Referência
As experiências internacionais apresentadas durante o seminário servem como importantes referências para o Brasil. A regulamentação da cannabis medicinal em países como Alemanha, Nova Zelândia e Estados Unidos oferece lições valiosas sobre como implementar um sistema eficiente e seguro para pacientes e profissionais de saúde.
Na Alemanha, por exemplo, a cannabis medicinal é regulamentada desde 2017, permitindo que pacientes com receita médica acessem produtos à base de cannabis através de farmácias. O sistema alemão é altamente controlado, garantindo qualidade e segurança para os usuários. Já na Nova Zelândia, a regulamentação recente priorizou a pesquisa científica e a formação de profissionais de saúde, criando um ambiente propício para o uso terapêutico da cannabis.
Nos Estados Unidos, a regulamentação varia entre os estados, mas há um consenso crescente sobre os benefícios da cannabis medicinal para condições como epilepsia, esclerose múltipla e dor crônica. A diversidade de abordagens nos EUA oferece um leque de modelos regulatórios que podem ser adaptados à realidade brasileira.
Desafios e Oportunidades para o Brasil
O Brasil enfrenta desafios específicos na regulamentação da cannabis medicinal, incluindo questões legais, políticas e sociais. A estigmatização da cannabis, herança de décadas de políticas proibicionistas, ainda é uma barreira significativa. No entanto, o crescente corpo de evidências científicas e o testemunho de pacientes que se beneficiam do uso terapêutico da cannabis estão mudando a percepção pública.
A regulamentação adequada pode trazer inúmeros benefícios, não apenas para os pacientes, mas também para a economia e a pesquisa científica. A criação de um mercado regulado de cannabis medicinal pode gerar empregos, fomentar a inovação e atrair investimentos para o setor de saúde e biotecnologia. Além disso, uma política bem estruturada pode reduzir a carga sobre o sistema judiciário e facilitar o acesso dos pacientes a tratamentos necessários.
O Caminho para a Regulamentação
O seminário internacional na Unicamp representou um passo importante na jornada do Brasil rumo à regulamentação da cannabis medicinal. O envolvimento de diversos atores, desde representantes governamentais até associações de pacientes, garantiu um debate plural e inclusivo.
A expectativa é que o relatório final do GT de Cannabis do Conad, enriquecido pelas contribuições do seminário, possa orientar a criação de políticas públicas que atendam às necessidades dos pacientes e aproveitem as melhores práticas internacionais. A regulamentação da cannabis medicinal no Brasil não é apenas uma questão de saúde, mas também de justiça social e desenvolvimento econômico.
Com uma abordagem baseada em evidências científicas e em uma articulação política robusta, o Brasil tem a oportunidade de se tornar um líder na regulamentação da cannabis medicinal, proporcionando alívio e qualidade de vida a milhares de pacientes. O futuro da cannabis medicinal no país depende da continuidade desse diálogo aberto e da implementação de políticas que reflitam as necessidades e aspirações da sociedade brasileira.
Fonte: https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/noticias/evento-na-unicamp-debate-o-tema-cannabis-medicinal-no-brasil